#10: João Maia Ferreira – O Lobo Um Dia Irá Comer A Lua (Sony Music Portugal)
No primeiro disco que assina com o seu nome de batismo, João Maia Ferreira (fka benji price) metamorfoseou-se. Para trás, fica o seu legado como um dos fundadores da Think Music e como um dos principais game changers do hip-hop tuga da segunda metade da década de 2010. Para a frente, resta aquele que é o verdadeiro João, exposto com as todas as suas vulnerabilidades na odisseia synth funk de O Lobo Um Dia Irá Comer A Lua.
E atenção. Em O Lobo Um Dia Irá Comer A Lua, João Maia Ferreira não se esqueceu que é um rapper. Pelo contrário. A palavra, neste álbum, importa. Simplesmente o destino onde João pretendia chegar era totalmente diferente daquele que tentou atingir pré-ígneo. Este é um disco que celebra a vida, mega dançável, cheio de bangers, em pleno contacto com a sonoridade da pop mainstream atual.
#9: EVAYA – Abaixo Das Raízes Deste Jardim (Saliva Diva)
Desde a primeira vez que ouvi INTENÇÃO, senti que o potencial artístico de EVAYA era gigante. Afinal, as canções desse EP, pop esparsa minimalista, eram especiais. Com Abaixo Das Raízes Deste Jardim, Beatriz Bronze provou que o seu potencial era legítimo – e talvez ainda maior do que se pensava.
Se as canções de INTENÇÃO eram minimalistas, as malhas de Abaixo Das Raízes Deste Jardim são o contrário. São faixas contemplativas na mesma, é certo, mas as texturas ganham nova dimensão, construídas pela artista com a ajuda de polivalente. É art pop onde a natureza se encontra com a tecnologia, onde EVAYA tenta encontrar o seu propósito e, em consequência, ajuda-nos a nós a encontrar o nosso.
#8: Dualus – IN ALIGNMENT (ensemblu)
Se não estão a par da escola de hip-hop de ensemblu, deviam. Não há outra estirpe de hip-hop em Portugal tão excitante como aquilo que este coletivo/crew/o que raio lhe queiram chamar está a cozinhar. E IN ALIGNMENT, o disco que Dualus, ou seja, Rafael Cardoso, lançou este ano, é uma verdadeira montra da sonoridade e experimentação que habita a génese deste conjunto de produtores e MCs.
Não curto nada de falar de música de vibes, mas IN ALIGNMENT é *excelente* música de vibes. É hip-hop espiritual que não é bem hip-hop, é jazz livre de ser o que quiser, mas que não é bem jazz também. Mas que é psicadélico e cósmico, como só o hip-hop do Porto sabe ser, isso é. E merece ser escutado com toda a atenção.
#7: Galgo – Denso (Saliva Diva)
Se é verdade que os Galgo terminaram a sua atividade musical, então ao menos fizeram-no deixando para trás mais um disco extraordinário numa discografia cheia de grandes discos.
Denso é, sem dúvida, um fantástico disco de rock. É pujante para caraças, está cheio de riffs metálicos, e cada malha funciona como uma viagem própria neste reino onde as aventuras (apimentadas por psicadélicos) parecem infinitas. Entre momentos de pura catarse a lembrar pós-rock até momentos turbulentos à math rock, os Galgo, em Denso, operam no pico da sua energia e criatividade. É pena que, ao que parece, a história da banda tenha mesmo terminado.
#6: DJ Nigga Fox – Chá Preto (Príncipe)
Admito que sou um enorme fã das batucadas da Príncipe, mas há qualquer coisa de especial e de diferente nestes lançamentos da editora lisboeta que operam num registo mais “suave” e espiritual. O pós-XEXA da Príncipe.
E Chá Preto, de DJ Nigga Fox, é um lançamento tão específico e delicioso nesse aspeto. Continua a dar para sentir as tarraxinhas e a batida que caracterizam a produção de Rogério Brandão, mas Chá Preto soa cerebral, espaçoso. Aliás, é o espaço existente em cada faixa que dá vida às malhas de Chá Preto. Os tons são afrofuturistas, de paz, interior e coletiva, que só surge quando abraçamos a dissonância do mundo real. Um disco único no catálogo de Nigga Fox e o meu lançamento favorito da Príncipe de 2024.
#5: Humana Taranja – EUDAEMONIA (Hey, Pachuco!)
Se Zafira revelou os Humana Taranja como uma das bandas mais promissoras do circuito alternativo nacional, EUDAEMONIA confirma-o. Guilherme Firmino (voz, guitarra), David Yala (guitarra), Filipa da Silva Pina (voz, teclas), Marta Inverno (baixo) e Afonso Ferreira (bateria) melhoraram enquanto músicos e, à boleia disso, aproveitaram a onda para cristalizarem a sua capacidade de escrever cantigas maravilhosas.
Em EUDAEMONIA, a banda do Barreiro cruza a sua sensibilidade pop com a sua devoção a bandas como os Linda Martini, vertendo cá para fora as suas dúvidas existenciais. Procuraram um espaço seguro e, no meio das turbulências incendiárias destas malhas, conseguem fazê-lo. Para chegarem lá, arrastam-nos com eles para esta habitação onde todos podemos entrar: a do amor. Quando forem grandes, não digam que não vos tentei avisar.
#4: Rafael Toral – Spectral Evolution (Moikai)
Às vezes, escrever muitas palavras sobre um determinado disco é contraintuitivo. Há discos onde a música fala por si só e tentar descrevê-la é um exercício inútil. É o caso de Spectral Evolution, o mais recente disco da lenda vida que é o “nosso” Rafael Toral.
A melhor forma de ouvir Spectral Evolution é fechar os olhos e deixar-nos ir. Neste disco, a natureza une-se à forma como o guitarrista utiliza o seu instrumento como uma abelha que pousa numa flor para colher o seu pólen. Com o seu instrumento, Rafael é atencioso, cuidadoso, esculpindo sons que nos encantam, encantam muito. Tudo aqui é belíssimo.
#3: JÜRA – sortaminha (Edição Independente)
Se me tivessem pedido no início de 2024 para nomear quem eu acharia que iria fazer o melhor disco pop da tuga do ano, não colocaria as minhas fichas na JÜRA. Não que não achasse que fosse impossível ela ter um disco como sortaminha dentro dela – afinal, “Milagre” foi uma das melhores malhas de 2023 na pop nacional –, mas, até agora, os EPs de JÜRA eram mais tristes do que felizes e sortaminha é um puto disco de celebração. Do amor, é claro. Merece ser escutado uma e outra vez e rodar infinitamente todo o santo verão daqui para a frente.
sortaminha é só bops. É um dos discos da pop portuguesa mais arrojado dos últimos anos (variedade sonora não lhe falta), o disco que todos achávamos que a Bárbara Bandeira ia entregar em 2023 e que a autora de “Como Tu” não foi capaz de concretizar. Num país digno, este disco teria sido #1 e gerado uma quantidade absurda de hits – porque todo ele é feito de potenciais hits. É o disco que melhor representa a personalidade de Joana Silva, em toda a sua grandiosidade, e que melhor representa a sua ambição – que é gigante. O disco do meu verão de 2024.
Ler entrevista no Rimas e Batidas
#2: YAKUZA – 2 (Edição Independente)
Conseguiriam os YAKUZA fazer um disco tão bom como AILERON? Feliz por indicar que sim, conseguem. 2 é um disco que confirma algo que digo desde 2020: não há nenhum projeto de jazz em Portugal tão excitante como o coletivo “liderado” por Afonso Serro (teclas), que conta agora em palco com AFTA3000 (baixo), Pedro Ferreira (guitarra) e Luís Possollo (bateria).
2 já não se encontra tão próximo da estética shibuya-kei de AILERON, mas soa a uma evolução do seu predecessor. Os YAKUZA não são uma banda que quer apenas fazer banda sonora para encontros de tunings, mas querem ser uma banda capaz de tocar em tudo o que é sítio. E em 2, fazem um argumento do caneco de que o seu jazz é, na verdade, bastante rock. Isto são malhas explosivas, desconcertantes, super dançáveis, deliciosas. O disco é extraordinário – e os YAKUZA são uma grande banda.
#1: Tomé Silva – Quando Voltar ao Chão (Fera Felina)
E mais uma vez, acordo a meio da noite, ansioso, e questiono para mim: “serei uma pessoa nostálgica?” Não consigo ter uma resposta concreta. Mas muitas vezes, dou por mim a pensar no passado, talvez até demasiado, a pensar como esse passado me transformou na pessoa que sou hoje.
Tentar encontrar um chão onde nos podemos sentar confortavelmente não é fácil. No caso de Tomé Silva, o exercício que efetua em Quando Voltar ao Chão é esse. Cola fragmentos que representam elementos de um passado não muito distante para tentar entender o seu presente. São elementos da memória estes sons que escutamos nestas canções que, de canção, não têm nada. São exercícios exploratórios que, na verdade, representam muito mais do que parece. É algo pretensioso, sim. Soa a projeto de semestre de uma Faculdade de Belas Artes. Mas também é fascinante, enternecedor, quentinho.
Quando Voltar ao Chão ajudou-me muito a sobreviver a 2024. Regressei uma e outra vez a este álbum em procura de paz. E de alguma forma, sempre a encontrei. Não sei bem porquê. Mas talvez o verdadeiro mistério seja esse. Às vezes, há discos que servem apenas para dar sentido à vida. Quando Voltar ao Chão é um desses.
#11 ao #30
#11: Bia Maria - Qualquer Um Pode Cantar (Edição Independente)
#12: roadkill - What To Do When The Earth Swallows You Whole (Edição Independente)
#13: 800 Gondomar - São Gunão (Edição Independente)
#14: Ana Lua Caiano - Vou Ficar Neste Quadrado (Glitterbeat)
#15: Maria Reis - Suspiro… (Cafetra)
#16: LEFT. - Limbo (Edição Independente)
#17: Capitão Fausto - Subida Infinita (Cuca Monga)
#18: Micro Audio Waves - Glimmer (Edição Independente)
#19: Nuno Beats - Sai do Coração (Príncipe)
#20: Emmy Curl - Pastoral (Cuca Monga)
#21: bbb hairdryer - A Single Mother / A Single Woman / An Only Child (Revolve)
#22: ARCANA - BAILE DE PERUCA (Edição Independente)
#23: MAQUINA. - PRATA (Fuzz Club)
#24: DJ Lycox - Guetto Star (Príncipe)
#25: Ece Canli - S A C R O S U N (Lovers & Lollypops)
#26: Cancro - Influência Artificial (Edição Independente)
#27: Branko - Soma (Enchufada)
#28: CAVEIRA - ficar vivo (Edição Independente)
#29: Mt. Roshi - Não Vá o Diabo Apetecê-las (Edição Independente)
#30: Astrodome - Seascapes (Copper Feast / Totem Cat / gig.Rocks!)
como estou feliz por encontrar sua página! trabalho com música e adoro ler críticas e listas