Clave de Sons #24: Os meus LPs internacionais favoritos de 2024
#10: Homecomings – see you, frail angel. sea adore you. (IRORI)
Será recency bias? Espero que não. Mas see you, frail angel. sea adore you. é, sem dúvida, o melhor álbum que Homecomings lançou até ao momento. New Neighbors, editado em 2023, já tinha sido uma melhoria face aos registos anteriores da banda japonesa, mas see you, frail angel. sea adore you. é um step-up face ao seu predecessor.
Estas são canções lindas, etéreas, preenchidas por guitarras apaixonantes, vocais sonhadores, ritmos que nos embalam rumo a um destino que não conseguimos visualizar, mas que desejamos alcançar. Não há dúvidas que o universo de Homecomings é sensível e cheio de carinho – dream pop com refrões do bem. Talvez seja por isso que tenha gostado tanto do álbum. 2024 foi, apesar de todo o caos, um ano cheio de carinho.
#9: Jack White – No Name (Third Man)
Tenho uma relação algo estranha com a discografia a solo do Jack White. Gosto muito de canções, mas fora o experimental Boarding House Reach, sinto que todos os discos a solo do ex-White Stripes ficam ligeiramente aquém. Os dois últimos, então, nem se fala. Mas sobre No Name, não se pode dizer isso. Não posso achar isso. É impossível. No Name é só grandes, grandes malhas. É Jack White em grande forma.
Querem riffs? Caneco, No Name está cheio deles. Tem malhas que soam a White Stripes? Tem, sim senhora. Tem canções com grandes refrões? Porra, se tem. Em No Name, Jack White relembra-nos que não há ninguém como ele a tratar o rock’n’roll desta forma no século vinte-e-um. Abençoado seja.
#8: Still House Plants – if I don’t make it, I love u (Bison)
A primeira coisa que me atraiu no disco de Still House Plants foi o seu título. if I don’t make it, I love u é o tipo de frase que preenche mentes, destrói corações. É símbolo de um amor perdido, agora regenerado. A música, de certa forma, soa assim.
As guitarras de Finlay Clark são desorientantes. A voz de Jessica Hickie-Kallenbach opera num registo ultra específico de sensibilidade e desejo. “I wish I was cool”, entoa em “M M M”. “I really like it my way”, soluça em “no sleep deep risk”. De fundo, a bateria de David Kennedy faz cenas que parecem não fazer sentido, mas preenchem o espaço necessário. É pós-rock, mas não é. Lembra Slint, mas também não é bem isso. É algo diferente. Desafiante. Polarizante. E eu gosto imenso.
#7: Nilüfer Yanya – My Method Actor (Ninja Tune)
Nilüfer Yanya é das grandes obreiras da música alternativa atual. No excelente PAINLESS (um dos meus discos favoritos de 2022), já tinha provado isso. Em My Method Actor, a artista britânica refina apenas a sua arte de escrever belíssimas cantigas. E consegue fazer isso muito bem.
Em My Method Actor, escutamos canções maravilhosas e que não perdem nenhuma das idiossincrasias da artista. Está entre o shoegaze e o jazz, a canção e o pós-punk à la Silent Alarm. Os tunings estranhos estão lá. A produção espaçosa também. Soa romântico, pomposo. E consistente. Se PAINLESS nos trocava as voltas em sonoridade, My Method Actor soa a uma obra coesa, soa a uma artista a trabalhar na plenitude da sua criatividade. É estonteante.
#6: Charli XCX – BRAT (Atlantic)
Por esta altura, falar de BRAT é quase um suplício. 2024 foi um ano longo em que toda a gente foi, de alguma forma, BRAT. Em que toda a santa marca foi BRAT. Em que até uma candidata à presidência dos Estados Unidos foi declarada BRAT (pela própria Charli XCX) quando, de BRAT, não tinha nada. Que raio se passou? Disco extraordinário ou campanha de marketing exímia? Um bocadinho de ambos, na verdade. (A amiga Carolina Franco explica na Shifter).
BRAT não é o meu álbum favorito da Charli – essa honra continua a pertencer ao extraordinário how i’m feeling now – mas encontra-se recheado de bangers. O verde-pirralha até se pode ter tornado exaustivo, mas o hype era justificado. Em BRAT, a linha entre honestidade e homenagem (à suposta exuberância dos anos 2000) é navegada de forma exímia. Muitos se relacionaram, muitos encontraram em BRAT um escape para o mundo real. Eu encontrei um bocadinho, talvez menos que outros. Mas é um grande disco – disso não duvido.
#5: Astrid Sonne – Great Doubt (Escho)
Acredito que o Larry Fitzmaurice tem razão quando diz que o indie está prestes a entrar numa trend influenciada pela lista de vozes (esotéricas) dinamarquesas que surgiram nos últimos anos (um artigo da Paste Magazine assinado pelo Devon Chodzin explica bem quem são essas vozes).
Desse conjunto de artistas, a Astrid Sonne é a minha favorita – e Great Doubt é um belíssimo trabalho. Isto são canções pop bizarras, isso é certo. Onde Astrid navega um certo esoterismo, certo. Mas onde tudo soa reconfortante. São dúvidas existenciais (e haverá maior dúvida que o amor?), romantismos eternos, desejo infinito. São canções sobre relações, na verdade. Sobre ânsia e saudade. Muita saudade. “Say that you love me / Say that you want to hold me tight / I am missing you”, canta em “Say you love me”, última canção do disco, um último desabafo que prosseguiu outros tantos. Não imaginava eu o quanto a Astrid tinha razão.
#4: Mannequin Pussy – I Got Heaven (Epitaph)
De alguma forma, todos os meus discos favoritos de 2024 representam algumas das minhas ansiedades. No caso de I Got Heaven, é a ânsia de crescer. O que é estranho. Quando era adolescente, achava que nem ia chegar aos 25, quanto mais aos 26.
Contudo, aqui estou. Vivo. Continuo com medo de crescer, mas, ao mesmo tempo, sinto que cresci imenso em 2024. Foi um ano de muitas aprendizagens, muitas revoluções. Curiosamente, dois sentimentos que as Mannequin Pussy bem cantam (ou melhor, ladram) em I Got Heaven. Entre a pujança do hardcore e a devoção à melodia do rock alternativo dos anos 90, não há dúvida que as Mannequin Pussy são mestras da catarse. O melhor álbum, e o meu favorito, de Marisa Debice (voz, guitarra), Kaleen Reading (bateria), Bear Regisford (voz, baixo) e Maxine Steen (guitarra, sintetizadores) até ao momento.
#3: Foxing – Foxing (Grand Paradise)
Os Foxing nunca soaram tão agressivos como em Foxing nem tão no limite da autocombustão. É um disco feito por uma banda a viver no limite que não esquece o seu passado, mas que o pretendeeliminar. Se os Foxing de The Albatross, esse clássico de fourth-wave emo, ouvissem os Foxing de Foxing, que achariam? Que tinham perdido a cabeça, provavelmente.
Foxing é um disco catártico. Quem escutou o “só” ok Draw Down The Moon, consegue perceber que os Foxing já andavam a brincar com algumas das dinâmicas explosivas que abraçam na totalidade em Foxing. Há screamo, shoegaze, chamber pop, ambient, e uma constante torrente de murros no estômago que dura quase uma hora. No final, estamos esgotados, em colapso total. “If I could I'd start over again / It’s been fun but I'd change everything”, canta em “Cry Baby” Conor Murphy. Os Foxing precisavam de mudar o seu rumo e conseguiram. Talvez, nós também.
#2: DIIV – Frog in Boiling Water (Fantasy)
Os DIIV são a melhor banda de shoegaze do momento. Desculpem, mas é a mais pura das verdades. Não adivinharia isso quando os descobri com Oshin em meados da década de 2010, mas tanto Deceiver como este Frog in Boiling Water são discos estupendos. No caso do último, os DIIV soam como a banda que sempre pretenderam ser. Uma banda feita de contrariedades, pronta a levantar as suas guitarras em direção a coisas que importam. Se Deceiver era explosivo, Frog in Boiling Water é calculado ao milímetro, à boa maneira do krautrock.
Os DIIV até podem cantar que querem desaparecer em “In Amber”, brilhante canção que abre o disco, mas a meio do álbum, revelam o que verdadeiramente os move: “I'm ready for my life / Can't wait”. Quem sabe o passado dos DIIV, sabe o quão importante é para Zachary Cole Smith (voz, guitarra), Andrew Bailey (guitarra), Colin Caulfield (baixo) e Ben Newman (bateria) comunicarem que é possível mudar e aprender com as estupidezes do passado. Não somos mais aquelas pessoas. Isso foi algo que compreendi em 2024, também. Os DIIV certamente ajudaram com isso.
#1: MJ Lenderman – Manning Fireworks (Anti)
As canções de MJ Lenderman funcionam como retratos, fotografias, pinturas de uma América triste, tristonha. Encontram-se entre a nostalgia, a solidão, a homenagem, a troça, o surrealismo. São canções embebidas em southern goth e countrygaze. E se Lenderman passou os últimos anos a aperfeiçoar a canção, em Manning Fireworks finalmente doma o formato. Isto são brilhantes cantigas, cantigas que se tornam imediatamente amigas e cuja amizade só se fortalece com o tempo. Os solos explosivos só ajudam a isso, estas canções serem tão tenras também.
Ouvi Manning Fireworks de forma incessante a partir do momento que saiu. “She’s Leaving You”, um dos singles, foi a canção que mais escutei em 2024. Há uma certa inocência em Manning Fireworks com que me relacionei. Se a vida fosse isto, talvez fosse boa. Jogar Guitar Hero até às tantas, olhar para o relógio, fumar uma e imaginar o Lightning McQueen a embater numa rena, pensar nela (ou nele) demasiado. Isso, talvez, não seja assim tão fácil. Mas Lenderman faz com que a compreensão de sentimentos pareça mais simples. “How many roads must a man walk down 'til he learns”, questiona Lenderman em “Rudolph”. A resposta é, infelizmente, muitas. Mas a vida é assim. Foi essa a maior lição que tirei de 2024. Obrigada, Mark Jacob.
#11 ao #40
#11: claire rousay - sentiment (Thrill Jockey)
#12: The Cure - Songs of A Lost World (Fiction / Universal)
#13: Nathy Peluso - GRASA (Sony Latin)
#14: Julia Holter - Something In The Room She Moves (Domino)
#15: Magdalena Bay - Imaginal Disk (Mom + Pop)
#16: Vince Staples - Dark Times (Blacksmith / Def Jam)
#17: Porridge Radio - Clouds In The Sky They Will Always Be There For Me (Secretly Canadian)
#18: Molchat Doma - Belaya Polosa (Sacred Bone Records)
#19: Fabiana Palladino - Fabiana Palladino (Paul Institute)
#20: Kali Malone - All Life Long (Ideologic Organ)
#21: Mabe Fratti - Sentir Que No Sabes (Unheard of Hope)
#22: Geordie Greep - The New Sound (Rough Trade)
#23: Nala Sinephro - Endlessness (Warp Records)
#24: Joanne Robertson e Dean Blunt - Backstage Raver (WORLD MUSIC)
#25: Clairo - Charm (Edição Independente)
#26: Sofia Freire - Ponta da Língua (Edição Independente)
#27: Nídia e Valentina - Estradas (Latency)
#28: Moin - You Never End (AD 93)
#29: Kendrick Lamar - GNX (pgLang / Interscope)
#30: The Hard Quartet - The Hard Quartet (Matador)
#31: Ekko Astral - pink balloons (Topshelf)
#32: Fontaines D.C. - Romance (XL)
#33: Lip Critic - Hex Dealer (Partisan)
#34: Mdou Moctar - Funeral for Justice (Matador)
#35: Kim Gordon - The Collective (Matador)
#36: Knocked Loose - You Won’t Go Before You’re Supposed To (Pure Noise)
#37: Friko - Where we’ve been, Where we go from here (ATO)
#38: GENDEMA - sassy things (Edição Independente)
#39: Erika de Casier - Still (4AD)
#40: Laura Marling - Patterns in Repeat (Chrysalis / Partisan)